Crônica do Amor Verdadeiro.

No passo dançante das horas invisíveis, me perco e piso em alguns pés. Transito pelo salão, desnorteada. Somente sinto o tempo acertado no ritmo, quando te encontro me espiando por detrás da viga. E este meu Quando encarna em ti, e o amo. Dançamos juntos, nos acompanhando na exatidão imprevisível dos passos coreográficos. Que seria mesmo de nós, humanos, sem a nossa própria presença? Os astros indiferentes não sabem amar como sabem os teus olhos pequeninos e adocicados. Amando, damos e tornamos vida. Isto para que só nos encontremos com a Morte após a termos zombado e nos beijado, enlameados em Terra preta, frente a sua careta inevitável.
Quando o vi pela primeira vez, não senti nada. Os montes não estremeceram, nem meus vasos se irrigaram. O vi como quem vê mais um elemento da paisagem natural. E ele me tocou, durante todos os anos que se passaram, como o peixe toca a água, como o oxigênio toca a gente; completa e corporalmente. Ele se fez canoa para mim, e deixei que ali o meu Tempo repousasse, já cansado e vagaroso de pairar. Com ele senti qualquer coisa como a responsabilidade de existir na Terra sem ser invisível como sou fora dela. Nele, dei movimento ao meu amor e conduzi a embarcação através de marés cor-de-rosa para cantos encantados da carne deste Planeta. Nele, após tudo que se deu, preservei o ato primeiro de ir, e a coragem de voltar transformada pelas ondas daquele olhar, que me lavaram com o sal ardido do alto mar. Com o calor do corpo dele, pude estar na Terra, ao passo que preservei meu espírito à livre distância daqui.