Bolsonaro e o Teto de Gastos: entraves da política fascista com a economia neoliberal.
O Datafolha mostrou na sexta-feira (14) que a porcentagem da população que avalia o governo do presidente Jair Bolsonaro em ótimo ou bom cresceu de 32% para 37%, evidenciando através de números o melhor índice de aprovação do governo desde o início de seu mandato. Esses dados revelam o impacto causado na sociedade civil pela continuidade do auxílio emergencial, mas também a fraca e ineficiente disputa de narrativa feita pela oposição. Inicialmente, o governo Bolsonaro havia proposto um valor de R$ 200,00 para ser entregue aos solicitantes do auxílio, sendo o valor de R$ 600,00 uma proposta dos partidos de esquerda. Quando, após três parcelas, chegou o momento de renovar o benefício, novamente a dupla Bolsonaro e Guedes propôs reduzir seu valor, mas através da resistência da oposição no Congresso o governo cedeu e manteve o valor de R$ 600,00. Essa notícia repercutiu de forma enviesada entre os setores da população dependentes do auxílio emergencial e acabou por favorecer os mais recentes índices de popularidade de Bolsonaro.
Mesmo assim, o presidente, preocupado com a popularidade típica de sua figura, vê-se encurralado perante um pico agudo de desemprego que faz constar desde o último trimestre de 2019 até agosto de 2020 um aumento percentual de 03,3%, saltando respectivamente de 11% para 13,3%. Dessa forma, ao cogitar o rompimento do teto de gastos, instituído no ano de 2016 e que limita os investimentos públicos por 20 anos, o governo proporcionaria a abertura de um crédito extraordinário de R$ 5 bilhões em dinheiro público destinado para investimentos em obras que fomentariam a indústria da construção civil e que consequentemente gerariam empregos. No entanto, mesmo essa branda possibilidade de proteção social parece preocupar tantos os economistas neoliberais integrantes do governo, quanto os próprios empresários. Isso fica demonstrado no editorial da Folha de S. Paulo intitulado “Jair Rouseff”, onde Bolsonaro é comparado a Dilma no que diz respeito ao trato, caracterizado como negligente, com o controle dos gastos públicos. Essa recente guinada em defesa das medidas de austeridade por parte de setores da mídia tradicional, demonstra o caráter instrumental do líder de extrema-direita nas mãos dos empresários interessados em lucrar com as medidas econômicas de austeridade e com o próprio desemprego em alta. Sendo assim, para os economistas, é importante que não haja obstáculos na execução dos interesses neoliberais perfeitamente aglutinados na figura de Paulo Guedes, mesmo que para isso Bolsonaro tenha que abrir mão de um de seus pilares mais importantes, que é o apoio das massas, e como consequência inevitável disso, também da garantia de reeleição por meios oficiais.
Sete trocas já aconteceram na equipe econômica de Guedes desde sua formação inicial em janeiro de 2019, sendo as saídas mais recentes a da Salim Mattar, secretário de Desestatização, de Paulo Uebel, até então responsável pelos assuntos de Desburocratização, Gestão e Governo Digital. Essas foram saídas muito significativas paro o governo, que fizeram o ministro da economia definir a situação como uma “debandada” e sentir a necessidade de reafirmar publicamente que avançará com a agenda de reformas. Paulo Guedes, representante da ala neoliberal do governo Bolsonaro, alertou também na quarta-feira (12) sobre a possibilidade de os processos de impeachment alcançarem Bolsonaro caso o presidente da república rompa com o teto de gastos do governo. Enquanto isso, Rodrigo Maia já recebeu 48 processos de impeachment contra Jair Bolsonaro, que foram ignorados pelo liberal, mas que aparentemente serão revistos caso o presidente desagrade os planos do capital financeiro para o Brasil. Como explica Mariatégui:
Enquanto o fascismo limita-se a decretar o ostracismo da liberdade e a reprimir a Revolução, a burguesia bate palmas; mas logo, quando […] começa a atacar os fundamentos de seu poder e de sua riqueza, a burguesia sente a necessidade de censurar seus bizarros defensores. (2012, p.49)
Dessa forma, vê-se que os setores da classe dominante se encontram atualmente em uma fachada de concordância antecedida por um longo semestre de discordâncias públicas e desconfianças da burguesia nacional com a ala ideológica do governo Bolsonaro. Mas a fala de Guedes, citada inicialmente, demonstra que esse consenso pode desmoronar a qualquer momento caso a preocupação política com a reeleição sobressaia ao seguimento intransigente da agenda econômica neoliberal.
Aparentemente, o neoliberalismo com suas medidas restritivas não possui muita adesão popular e os índices de aprovação de Michel Temer, que segundo o Datafolha constavam em 7% no último mês de seu mandato, foram uma prova disso. Porém, diferentemente de Temer, Bolsonaro é não apenas um representante do neoliberalismo econômico como também uma figura que conduz uma política autoritária de extrema-direita com forte apelo popular e militar, logo, acaba caindo na dualidade de manter os interesses dos capitalistas intactos ou dar a atenção devida a sua popularidade; um entrave entre economia neoliberal e política fascista no interior do atual governo. Tendo esses acontecimentos em vista, é preciso, como alertava Luxemburgo no início do século XX ao se referir aos aspectos da acumulação de capital, “esforço para discernir nesse emaranhado de violência política e lutas pelo poder as leis férreas do processo econômico.”